segunda-feira, janeiro 09, 2006

Análise: Acossado

Por Carina Rabelo

O filme “Acossado”, de Jean-Luc Goddard, modificou os padrões cinematográficos da época - como a unidade da montagem e do roteiro, a continuidade dos diálogos e a sutileza dos cortes. O filme instaura a quebra narrativa, prioriza cenas ágeis, utiliza ângulos de câmera fora do comum, testa edições elípticas e introduz cortes rápidos – o que influenciou bastante o cinema americano dos anos 60 – mas, ainda assim, mantém espaço para a reflexão. No entanto, é importante frisar que o aspecto mais relevante deste filme não está no seu conteúdo, mas na sua forma inovadora – o “modo” de contar a história.

A metalinguagem é outra característica marcante da obra, que, por diversos momentos, faz referências a outros filmes, atores, diretores e diversos elementos do mundo do cinema. É como se a obra não estivesse tão preocupada em ‘contar uma história’, e se ocupasse mais da experimentação das diversas possibilidades fílmicas, através de um ousado roteiro e de uma montagem inovadora - que chega a gerar algum estranhamento ou repulsa na apreciação. Até então, nada igual tinha sido feito no cinema.

O filme propõe uma ruptura com o modelo tradicional da narrativa literária e defende que o cinema tem que explorar as múltiplas possibilidades do formato do filme, e não as gastas estratégias poéticas da literatura.

Acossado provou aos cineastas da época que era possível cortar um plano-sequência e mostrar o que estava cortado. Era possível mostrar o mesmo plano duas vezes. Era possível experimentar, criar e sair dos eixos do cinema clássico. O cinema foi tratado ineditamente como um material plástico maleável, cuja forma ultrapassava os limites da imaginação. Pela primeira vez, percebia-se conscientemente que o cinema é um instrumento de expressão artística, sem limites, e que o apreciador deve obedecer às condições de fruição específicas que o formato exige.

Um outro aspecto inovador importante é a introdução do anti-herói como protagonista do filme (não há o maniqueísmo do bem x mal), e a quebra dos perfis tradicionais do ‘herói cinematográfico’. Michael Poiccard, protagonizado por Jean-Paul Belmondo, era um ladrão moralmente condenável, não tinha características admiráveis e nem mesmo era bonito - principalmente quando comparado ao estilo de beleza greco-romana exaltada pelos filmes de Hollywood. E assim, Poiccard era perfeito como ‘herói’ da Nouvelle Vague, como um homem comum, um homem contemporâneo. O estilo do filme tem um profundo efeito na história do cinema e abre caminhos para uma estética mais livre e pessoal.

2 Comments:

Blogger Ricardo Silva said...

Filme maravilhoso, parabéns pelo texto.

18 de maio de 2012 às 21:19  
Blogger Ricardo Silva said...

Carina, publicarei a sua análise em meu blog colocando em evidência seu nome e endereço de seu blog, se achar um abuso de minha parte é só me comunicar que prontamente excluirei seu texto.

18 de maio de 2012 às 21:33  

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